Naiane Reis*

Ontem, ao ver meu entusiasmo em relação ao "épico" jogo da semifinal, meu antenado marido tentava me explicar que a seleção da Alemanha tinha se mostrado um grande time, com muita qualidade técnica. Explicou-me algumas especificidades de um bom time que já não me lembrava na hora seguinte. Diante de sua explanação empolgada, lhe disse: "amor, eu só não consigo torcer por qualquer time europeu. Para mim, não é apenas um jogo". E nunca será. Mesmo sem dar muita atenção ao futebol, apesar de ser uma torcedora tresloucada na copa, sofri pela final da África do Sul. Foi com muita dor que via duas seleções europeias lutando para ser campeã no futebol naquele país. Porque, para mim, não era apenas futebol.

Nessa história de não ser apenas futebol, vejo que não estou sozinha nos modos de torcer na copa. Pelo que vejo nas redes sociais, jogo futebolístico e jogo político andam de mãos dadas. De uma torcida fervorosa, mesmo diante de um time com alguns "desequilíbrios técnicos", passo a ver novamente uma discussão acirradíssima sobre o cenário político brasileiro. Para alguns, os resultados da nossa seleção na Copa impactam diretamente o resultado das eleições que estão por vir. Com uma certa angústia, penso, então, nas nossas eleições e eleitores: que tipo de formação política leva um cidadão a relacionar um jogo de futebol ao processo eleitoral? o fato da seleção brasileira perder representa o que o país significa no cenário político, econômico e social? e se fosse um caso de vitória, não haveria inquietações?

Aprendi que preciso me posicionar. Continuo aprendendo e me posicionando nas situações que poderiam ser vistas como banais. Em São Paulo, todos os dias me vejo e me posiciono como tocantinense. Na Unicamp, sempre me apresento como uma aluna da Universidade Federal do Tocantins, como orientanda dos professores da Pós-graduação em Letras da UFT. Tais posicionamentos são reafirmados diariamente porque ter clareza de onde venho me ajuda a entender os eventos à minha volta. Posso vir a firmar moradia em terras paulistas e ser aluna da universidade pública da cidade onde vivo, mas não deixaria de ser o que cotidianamente me afirmo como tal.

Me diverti deveras com a "Copa das zueiras". Queria que a Costa Rica fosse a campeã da "Copa das Copas". Torci para que Irã fosse para as oitavas de finais com três empates de 0x0. O que de fato não me diverte é ver menes no Facebook que "cobram" ou divulgam a compra dos resultados desta Copa por parte da presidenta. Novamente entra em jogo minha incapacidade de separar as coisas. Piadas com minorias não me diverte. Exclusão não é explicável. Corrupção não tem graça. Após um levante bastante numeroso no ano passado, vejo que quase as mesmas vozes brincam com o triste histórico político nacional. De onde venho e para onde quero voltar, vejo que os casos de corrupção estão ainda mais arraigados e naturalizados pelos cidadãos. Por esse mesmo motivo, vejo uma política ineficiente, incapaz, burra. Vejo os deboches das pessoas comuns sobre os políticos que não "enricam" durante um mandato na administração pública. Enquanto isso, e por isso, há, arraigada na nossa alma, uma resignação pelas ruas esburacadas, pelo hospital lotado e com falta de manutenção, pelos sucessivos boicotes à educação (de forma geral), além de muitos outros etc que sabemos que irão se repetir, pois nós mesmos não nos incomodamos com nossa ignorância política. E é aí que experimentamos a crueldade de nossos discursos e posicionamentos políticos, pois uma coisa continua sendo uma coisa.

Perfil 

Naiane Vieira dos Reis Silva é Mestre em Ensino de Língua e Literatura pela Fundação Universidade Federal do Tocantins (2014). Foi bolsista do CNPq na modalidade PIBIC durante dois anos, pesquisando o ensino de leitura em material de formação de professores com embasamento na teoria semiótica discursiva. Gentilmente colabora com o Araguaína Notícias.